Caminhando sem olhar para trás...




Há algum tempo, um grande e estimado amigo contou-me a seguinte história:
“Dois monges haviam saído do mosteiro e caminhavam pela estrada rumo à cidade. Ao passarem por um rio, avistaram uma bela jovem, cuja face demonstrava descontentamento e aflição, pois necessitava ir ao outro lado, mas não possuía nenhum barco. O mestre, então, tomado por súbita compaixão, ofereceu levá-la em seu colo. A jovem aceitou o favor e juntos alcançaram o lado oposto do rio, onde ficava um vilarejo. De volta à estrada, o mestre seguia calado, até que seu discípulo, visivelmente perturbado, o questiona:
- Mestre, como o senhor pôde carregar aquela bela jovem em seus braços? Não sabe que devemos ser castos e evitar pensamentos pecaminosos?
O mestre, calmamente, responde:
- Mas em momento algum fui invadido por tal pensamento. Apenas fui caridoso e conduzi a jovem até o seu destino desejado, deixando-a de imediato. Você que ainda a carrega nos pensamentos.”
            Ampliando a mensagem da história e aplicando-a em nossas realidades, podemos nos questionar se ainda carregamos em nossa mente alguns fatos, situações ou pessoas que, por algum motivo, nos marcaram, porém  já atravessaram o rio da vida.
            Desconheço o motivo pelo qual insistimos demasiadamente em manter aquecida essas impressões. Por vezes boas, causando-nos intensas e prazerosas nostalgias, mas que podem nos prender ao passado, dificultando o nosso caminhar para o futuro. Ou as ruins, que  são alimentadas diariamente por nós, e por sermos masoquistas, continuamos a nos cortar e ferir com a lâmina afiada da raiva, rancor, inveja e ego maltratado.
Convenhamos que deixar a ‘jovem’ atravessar o rio e seguir em frente, sem olhar para trás é árduo e penoso. Contudo, eu anseio tanto ser livre, correr pela relva refrescante das novidades, sentir o aroma adocicado do perdão, a maciez da paz de espírito e alcançar o fim dessa grande estrada, que é longa, mas que permite a todos caminhar.
Os bons momentos ficam como lembrança agradável de um passado bem vivido e não como prisão, na qual devo me acomodar e ver cada pôr do sol através de uma vidraça empoeirada, que nada mais é do que o meu olhar estagnado no tempo. As más experiências também se acabam e seguem seu rumo junto ao baú profundo de nossa memória.
Deixemos o monge da renovação encaminhá-los ao outro lado do rio, e sigamos em frente, com a absoluta e feliz certeza que somos aprendizes eternos, mas que em um dia bem distante, poderemos ser o mestre.
           
Bruna Lupp

Comentários

  1. Eu tô que nem tu: desconheço o motivo pelo qual insistimos demasiadamente em manter aquecidos certos momentos que nos prendem ao passado, entre eles aqueles que dificultam a nossa caminhada para o futuro.

    Mas outro dia vi uma cena (http://www.youtube.com/watch?v=lJYLHoRqIsI) no documentário “Pina”, de Win Wenders, que me esclareceu uma coisa: às vezes, vou viver preso a certos momentos do passado e ponto; impossível acontecer o contrário. Só que, em vez de tentar desesperadamente me desprender deles, posso ficar preso ao passado de maneira que viver não seja uma inquietação sem fim.

    Seu texto suscita outras discussões bacanas. É aquilo que já conversamos: quando escreve, você consegue observar pontos importantes que estão em torno de um assunto. Taí o começo de um estilo que vale muito a pena desenvolver, não acha? Muito legal, Bruna.

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  2. Bacana como sempre, Bruna. Vc está, cada dia, melhor.
    Lilly

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  3. ando desse jeito mesmo, guardando magoa de uma pessoa q me fez mal e brincou com meus sentimentos. mas agr é olhar pra frente e ver q perto, principalmente no mesmo prédio e na mesma facul, tem gente q pode abrir meus caminhos para a felicidade ;)

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